"Sobre fotografia, com mais ou menos poesia".

A chuva

No asfalto que leva ao Parque das Emas a partir da cidade de Mineiros, Cumulus no horizonte anunciavam que não ia ser fácil, que as trilhas estariam enlameadas, que a chuva poderia castigar o carro, o equipamento e que sustos iriam surgir no caminho, através do imenso Cerrado. Mas era o tempo que eu tinha para ir ao Parque fotografar e filmar, então seguimos em frente, eu e meu carro, eu e minhas ferramentas de trabalho, sempre com as nuvens ameaçadoras sobre o asfalto e sobre o sentimento de solidão.

A chuva sempre me trouxe emoções mistas de alegria e de apreensão. Como um deus pagão que pode premiar ou castigar, ela e o vento exercem um fascínio sobre mim que ainda não consegui explicar e nem transformar em palavras. Mas tento: nada há tão leve quanto um dia claro de céu azul e uma brisa confortante no rosto, assim como o som da água batendo no solo e o cheiro de terra molhada de uma chuva firme e constante. E nada há de tão assustador quanto estar sozinho em uma imensidão de terra primitiva e se ver sob uma ventania furiosa, rodeado de trovões e relâmpagos, com o dia se transformando em noite precoce e onde o abrigo das árvores se transforma em armadilha e a curva à frente na trilha pode conter surpresas desagradáveis.

Pois entrei no Parque, tive tempo de preparar câmeras e lentes com suas parafernálias e segui pela trilha ainda sem chuva e com pouco vento, mas com o céu ameaçando desabar em água a qualquer momento. Rodei quase 50 km pela trilha, observando ao longe as grandes precipitações de água e fotografando, apesar de uma chuva teimosa e fina que ia e que vinha, a toda parada me obrigando a correr para o carro para me proteger da água que insistia em molhar meu rosto, minhas roupas, câmeras e lentes. E foi na volta, pela mesma trilha, que o céu desabou em água.

Foram os mesmos 50km de chuva torrencial, grandes poças d’água escorregadias e pegajosas que se formaram rapidamente na trilha e que me fizeram ficar com os músculos das costas retesados pela permanente luta para manter o controle do carro e evitar uma derrapagem, um atolamento e a consequência de ficar preso, sozinho, no meio do nada.

Mas houve uma breve trégua no temporal que me permitiu parar um pouco para pegar fôlego e descobrir, bem ao meu lado, as mimosas do campo cheias de pingos d’água, resistentes e resilientes, lindas na sua simplicidade, talvez conscientes de que seu conjunto ajude a formar as belas paisagens dos campos limpos do Cerrado.

2021

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